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Chinaglia, Pelé e Beckenbauer nos tempos gloriosos do Cosmos |
Imaginem
uma seleção mundial na qual atuariam nomes consagrados como os
holandeses da famosa “Laranja Mecânica” de 1974 Johan Neeskens e
Johan Cruijff, o polonês Wladyslaw Zmuda, o italiano Giorgio
Chinaglia, o paraguaio Romerito, o “Kaiser” alemão Franz
Beckenbauer e os brasileiros tricampeões mundiais em 1970 no México
Carlos Alberto Torres e o Rei Pelé. Imaginaram? Pois é, esse time
existiu de fato. O nome: New York Cosmos, clube norte-americano que
ganhou destaque nos anos 70 e 80 por montar times recheados de astros
mundiais.
O
clube nasceu por meio dos irmãos turcos Nesuhi e Ahmet Ertegün,
donos da Atlantic Records – fundada por Ahmet em 1947. A gravadora
teve grande destaque no cenário musical nos anos 50, quando revelou
Ray Charles – que se tornaria um astro, uma lenda do jazz, do soul
e do blues. Esmagada pelas mega gravadoras, a Atlantic foi vendida
para a Warner Communications (atual Time Warner) em 1967. Amantes do
futebol, os irmãos resolveram investir num sonho. Ao lado de Phil
Woosnam, ex-jogador galês e presidente da NASL (North-American
Soccer League, ou Liga Norte-Americana de Futebol) e do inglês Clive
Toye, resolveram buscar parceiros para criar um clube em Nova Iorque.
A “nova” liga fundada em 1968 para desbancar a American Soccer
League (Liga Americana de Futebol), que não tinha força econômica
e perdia clubes de forma surpreendente, já contava com 6 clubes de
todo o país (e do Canadá). Só faltava um clube do maior centro
econômico do mundo. Então Nesuhi Ertegün, Phil Woosnam e Clive
Toye sugeriram ao presidente da Time Warner, Steve Ross, investir no
“soccer”, pois acreditavam na viabilidade econômica da nova Liga
e também no crescimento do futebol no país. A partir daí, o New
York Cosmos nasceu oficialmente no dia 4 de fevereiro de 1971 e ao
mesmo tempo já fazia parte da NASL.
O
projeto, na verdade, começou em meados de 1970: o clube chamava-se
Gotham Football Club e tinha Clive Toye como gerente geral. Os irmãos
Ertegün queriam mudar o nome para New York Blues. No entanto, Toye
queria criar um nome impactante para o clube, algo que refletisse as
possibilidades que ele imaginava para o clube. Ele queria se sentir
maior do que o recém-formado time de baseball New York
Metropolitans, conhecidos como “Mets”. Toye disse que
“Cosmopolitans” era maior do que Metropolitans. Estabelecido este
nome, o clube seria coloquialmente chamado de “Cosmos”. E no dia
4 de fevereiro de 1971, foi oficialmente batizado como New York
Cosmos. O uniforme também foi sugestão de Toye: as cores iniciais
das camisas e calções do time eram verdes – uma homenagem à
seleção brasileira que conquistou a todos na Copa do Mundo no
México em 1970. Os anos foram passando e as cores do uniforme foram
se modificando: de verde para verde e amarelo em 1974; depois para
verde e branco; em seguida somente branco (em 1975) e a última
mudança foi de branco para azul nos anos 80.
O
clube disputou sua primeira partida oficial no dia 17 de abril de
1971, contra o Saint Louis Stars. Vitória do Cosmos por 2x1.
Inicialmente
o Cosmos era uma aventura e tinha poucos investimentos. Porém, ao
passar dos anos, Steve Ross, empolgado com o projeto, começou a
utilizar os recursos da Warner e foi contratando jogadores famosos
como Pelé, Beckenbauer, Chinaglia, Carlos Alberto Torres e Cruijff,
chegando a formar um grupo de 16 nacionalidades diferentes. O poder
econômico do Cosmos começou a refletir dentro de campo, com cinco
conquistas nacionais da NASL (em 1972, 1977, 1978, 1980 e 1982) –
se tornando a principal equipe e também a mais poderosa dos Estados
Unidos. E fora do país, era conhecida como a equipe mais glamourosa
do mundo. O Cosmos não era só um time de futebol, fazia parte do
showbiz. Graças ao clube nova-iorquino, o “soccer” ganhou tanta
popularidade no país que especialistas começaram a dizer que o
futebol americano estava passando por uma “morte lenta”. Todas as
atenções da mídia estavam voltadas ao futebol – e principalmente
ao Cosmos.
A
presença de Pelé na liga americana fez com que muitos jogadores
famosos europeus e sul-americanos acertassem com outros clubes do
país e também com o próprio Cosmos. Tanto que um dos rivais na
NASL, o Los Angeles Aztecs contratou o norte-irlandês George Best
(ex-Manchester United) e o holandês Johan Cruijff (craque da Copa de
1974 que disputou apenas uma partida pelo Cosmos em 1978).
Pelé
chegou ao Cosmos em 1975, depois de atuar por 18 no Santos e marcar
1087 gols. O Rei do Futebol já tinha encerrado a carreira no próprio
Santos em 1974, mas uma proposta milionária na época (cerca de US$
3 milhões em três temporadas) seduziu o Rei de tal maneira que ele
partiu para os EUA e voltou a jogar profissionalmente. Nessas três
temporadas, Pelé atuou com excelência e maestria em 64 partidas,
marcando 37 gols e conquistando o título nacional em 1977. Após a
conquista da Liga, Pelé se despediu do futebol no dia 01 de outubro
de 1977, num Giants Stadium lotado. O evento foi transmitido para o
mundo inteiro e teve as presenças do lutador Muhammad Ali e do
ex-capitão da seleção inglesa Bobby Moore. Antes da partida, Pelé
se pronunciou aos torcedores, repetindo por três vezes a palavra
“love” (amor) e se emocionando com o carinho dos fãs. Jogando
contra o Santos, o Rei atuou cada tempo em uma equipe. Marcou o
primeiro gol do Cosmos de falta no primeiro tempo. No segundo tempo,
já com a camisa do Santos, teve uma participação discreta e o
Cosmos venceu a partida por 2x1 – o atacante peruano Ramon Mifflin,
que entrou no lugar de Pelé, marcou o segundo do Cosmos e Reinaldo
marcou pelo Santos. No final da partida, o Rei deu uma volta olímpica
carregando em suas mãos uma bandeirinha do Brasil e outra dos EUA,
se despedindo de vez do futebol.
Depois
da passagem do Rei pelo Cosmos, o time continuou a encantar o mundo
não só com suas estrelas, mas com o futebol bem jogado. Não tinha
medo de enfrentar ninguém. Tanto que, em 1979, encarou a Argentina
de Maradona que tinha acabado de ganhar a Copa do Mundo em casa no
ano anterior. A disputa foi em Nova Iorque e os argentinos venceram a
disputa por 1x0, gol de Daniel Passarela.
O
time nova-iorquino também já enfrentou clubes brasileiros. Além do
Santos, adversário na despedida de Pelé em Nova Iorque (voltariam a
se enfrentar em 1979 na Vila Belmiro, com vitória norte-americana
por 2x1), o Cosmos jogou também contra o Grêmio em 1981 (vitória
gremista por 3x1) e o São Paulo em 1983 (vitória do tricolor por
3x2, com 3 gols de Careca) – todos no Giant Stadium.
Como
de início o Cosmos não tinha um estádio próprio, o time jogou em
cinco campos diferentes: no Yankee Stadium (do time de baseball New
York Yankees), no Hofstra Stadium (da Universidade de Hofstra em Long
Island), no Downing Stadium (estádio usado por atletas de atletismo,
localizado na Ilha Randall) e no Giant Stadium (do New York Giants,
time de futebol americano). Com o passar dos anos, por causa de suas
estrelas mundiais, o time se viu obrigado a atuar num estádio com
capacidade maior, já que o público que queria ver as partidas só
aumentava. Ou seja, a maioria das partidas disputadas pelo Cosmos em
sua história foi no estádio dos Giants.
Nos
anos 80, já com o alemão Franz Beckenbauer e o holandês Johan
Neeskens, mais o paraguaio Romerito, o italiano Giorgio Chinaglia e
os brasileiros Rildo e Carlos Alberto, o Cosmos ainda era admirado e
idolatrado pelo mundo, mesmo após a aposentadoria de Pelé. Porém,
após a passagem do Rei do Futebol, tanto a NASL quanto o próprio
clube começaram a entrar em declínio. O clube não tinha um nome
forte para desenvolver o crescimento do esporte nos EUA, como ele. A
liga começou a perder investidores e principalmente o apoio da TV.
Foi estipulado um teto salarial para os clubes e a maioria dos
jogadores europeus que tinham ido jogar na América por causa dos
altos salários voltou para o velho continente. A média de público
também foi caindo. Sem forças para reagir, o Cosmos encerrou suas
atividades em 15 de setembro de 1984.
Em
14 anos de história, foram 359 partidas oficiais, com 221 vitórias,
18 empates e 120 derrotas. Marcou 844 gols e sofreu 569.
Consequentemente,
a Liga de futebol dos EUA também encerrou as atividades no final do
ano. Desde então, não houve nos EUA outra liga profissional de
futebol que pudesse substituir a NASL. O futebol lá voltaria a
tornar-se um esporte amador. Até que, em 1996, cria-se a Major
League Soccer (MLS). Com novos clubes, patrocinados por grandes
empresas e, com investimentos altíssimos, o futebol volta ao
profissionalismo. E as grandes estrelas começaram a voltar ao país.
As
dívidas foram um fator determinante para o fim do Cosmos. Tanto que
a Warner teve que vender o clube para pagar as dívidas. Giorgio
Chinaglia, atacante que jogou no time entre 1976 a 1983 e foi o maior
artilheiro da história do Cosmos com 193 gols em 213 jogos, comprou
da Warner a Global Soccer Inc., subsidiária que controlava o Cosmos,
em 1984. Tentou reativar o clube com apresentações de showbol, mas
não durou muito tempo. Anos depois, Chinaglia vendeu o Cosmos ao seu
ex-sócio, o também italiano Giuseppe “Peppe” Pinton que também
foi diretor do clube.
Pinton
se reservou a guardar a história do Cosmos em seu escritório em
Nova Jersey e foi seduzido diversas vezes a vender a marca Cosmos a
fãs órfãos desse clube histórico. Tanto que depois de mais de 20
anos de inatividade, ele foi convencido de que tinha de vender os
direitos do clube.
Em
2006, Gavin Newsham escreveu o livro chamado “Once in a Lifetime”
(Uma vez na vida: A Incrível História do New York Cosmos), contando
a história do clube. Baseando-se no livro, a produtora nova-iorquina
Miramax produziu o filme com o mesmo nome, trazendo dirigentes e
jogadores que passaram pelos 14 anos de história do clube. O filme
teve a narração do ator Matt Dillon e foi muito elogiado por
público e crítica. Mas não ficaria só nisso. A história do
Cosmos teria um segundo capítulo.
Em
agosto de 2010, o empresário inglês (e ex-diretor do Tottenham
Hotspur da Inglaterra) Paul Kemsley comprou o New York Cosmos de
Pinton por um valor não divulgado. Em setembro do mesmo ano, Kemsley
nomeou Pelé como presidente de honra do Cosmos. E ao mesmo tempo, o
Rei anunciou em coletiva pra a imprensa o renascimento do Cosmos, mas
com atividades direcionadas à formação de jogadores.
No
dia 19 de janeiro de 2011, o Cosmos começa a sonhar com o retorno ao
futebol profissional e contrata o francês Eric Cantona para ser o
diretor de futebol. O ex-jogador de Manchester United estará ao lado
do Rei e do também ex-jogador norte-americano Cobi Jones. O
ex-lateral da seleção americana, que também jogou no Vasco da
Gama, será diretor adjunto e embaixador do clube. Os três trabalham
juntos para fazer o Cosmos ter um time e incluí-lo na MLS o quanto
antes. “Já sonho com uma disputa entre o Cosmos e o New York Red
Bulls!”, disse Pelé sobre a possibilidade de o Cosmopolitan
encarar o time de Thierry Henry na liga norte-americana. No dia 4 de
fevereiro, o clube comemorou o seu 40º aniversário sonhando com o
futuro.
Tudo
indica que o clube que encantou o mundo, e que ficou conhecido como o
segundo clube onde Pelé jogou profissionalmente, vai voltar. Tanto
que o site oficial do clube usa vídeos com lances mágicos dos
craques que por lá brilharam e assina com a frase “Twice in a
lifetime” (Duas vezes na vida). O time que teve a América e o
mundo aos seus pés está renascendo. Para aqueles apaixonados por
futebol, os mais místicos diriam: “Os deuses do futebol
agradecem!” Nós torcedores também.
Nome:
New York Cosmopolitan “Cosmos”
Ano
de fundação: 4 de fevereiro de 1971
Federação:
Liga Norte-Americana de Futebol (MLS – Major League Soccer)
Cidade:
Nova Iorque – EUA
Estádio:
Giant Stadium, capacidade para 80.200 mil pessoas
Site
oficial: www.nycosmos.com
Títulos:
5 campeonatos norte-americanos (1972, 1977, 1978, 1980 e 1982) e 3
Copa Trans-Atlantica (1980, 1983, 1984)
Texto publicado no Trivela dia 16 de março de 2011: http://trivela.uol.com.br/blog/lado-b/new-york-cosmos-duas-vezes-na-vida/
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