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Os "Mágicos Magiares" vice-campeão mundial de 1954. O melhor time húngaro da história |
Nove de junho de 1986. Primeira fase da Copa do Mundo no México. As 31 mil pessoas presentes no Estádio Nou Camp em León viram jogar pela última vez a seleção que já foi uma das mais poderosas do mundo. A partida contra a França (vencida pelos Bleus por 3 a 0) foi a última partida da seleção da Hungria em Copas do Mundo e o fim de uma era que marcou a história do esporte bretão.
A seleção magiar assombrou o mundo nos anos 1950 com um time mágico, considerado uma das melhores equipes de todos os tempos. Nomes como Ferenc Puskás, Sándor Kocsis, Zoltán Czibor e Nándor Hidegkuti encantaram o mundo com muitos gols e muita genialidade. Essa história mágica começa em 1902 contra a Áustria em Viena, quando ocorreu a primeira partida internacional dos Magiares. Vitória por 5 a 0. A Hungria também foi a primeira seleção não britânica a vencer os ingleses no lendário Estádio de Wembley, em 25 de novembro de 1953 pela Copa Dr. Gerö (percussora da Eurocopa), vencendo por 6 a 3.
O mundo se lembra daquele esquadrão Húngaro dos anos 50, mas a seleção começou a se destacar no cenário internacional a partir da década de 30. Sua primeira participação em Mundiais foi na Copa do Mundo da Itália em 1934 – que já começou nas oitavas-de-final – com vitória sobre o Egito por 4 a 1, porém sendo eliminado por 2 a 1 pela Áustria na fase seguinte.
Na França em 1938, a Hungria encanta o mundo pela primeira vez: uma campanha intocável, com 3 vitórias (sobre Indonésia, Suíça e Suécia) e um saldo de 13 gols a favor e 1 contra. A bela campanha seria premiada se os Magiares vencessem nada mais nada menos do que o campeão do mundo na época. Na final, em Paris, a Itália de Giuseppe Meazza, Silvio Piola e do técnico Vittorio Pozzo venceu a Hungria por 4x2 e faturou o bicampeonato. Nos anos 40, em meio às batalhas na Europa por decorrência da II Guerra Mundial, o futebol ficou de lado. A Hungria, entretanto, preparava uma das melhores equipes de todos os tempos, a qual encantou o mundo na década seguinte. Um time de lendas.
No Mundial do Brasil, a IV Copa do Mundo, em 1950, a Hungria não esteve presente. Só em 1952, nos jogos Olímpicos de Helsinque (Finlândia), a equipe dava indícios que logo estaria de volta para encantar: o time húngaro já contava com Puskás, Czibor, Kocsis, Hidegkuti, Bozsik e o goleiro Grosics. Campanha de 5 jogos, 5 vitórias e saldo de 20 gols marcados e 2 contra. Passou por Romênia (2 a 1), Itália (3 a 0), Turquia (7 a 1), Suécia (6 a 0) e, na decisão contra a Iugoslávia, vitória por 2 a 0 – gols de Puskás e Czibor. E o primeiro título no currículo.
Em 1954, o time húngaro chegaria ao auge. Classificado após a desistência da Polônia, desembarcou na Suíça com moral pelo título olímpico e o status de time imbatível. A seleção não perdia uma partida desde o dia 14 de maio de 1950. Na primeira fase, goleadas sobre a Coréia do Sul (9 a 0 – o maior placar da história dos mundiais) e sobre a Alemanha Ocidental (8 a 3), classificando-se em primeiro lugar para as quartas-de-final. A próxima vítima seria a seleção brasileira.
O time brasileiro jogava pela primeira vez de amarelo (a camisa branca usada anteriormente foi aposentada após a derrota na Copa do Mundo de 1950) e acreditava numa vitória sobre a máquina magiar, já que nunca havia perdido – especialmente porque o time da Hungria não contaria com a participação do cérebro do time, o atacante Puskas, que sofrera uma contusão no tornozelo após a vitória sobre a Alemanha. O Brasil, porém, teve uma amarga surpresa.
Dentro de campo, os brasileiros viram os húngaros com as camisas já ensopadas de suor – enquanto os brasileiros ouviam o blábláblá dos dirigentes da CBD, os magiares se aqueciam num campo próximo ao Estádio Wankdorf. Com a bola rolando, as coisas só foram piorando para a seleção canarinho. Já aos 4 minutos a Hungria abria o placar com Hidegkuti. Aos 7, Kocsis fez 2 a 0.
Os húngaros voavam em campo. Muito bem condicionados fisicamente, misturavam vigor e técnica e conseqüentemente arrasavam todos os que enfrentavam. Esse vigor também foi usado para agredir. Os brasileiros, nervosos, agrediam os húngaros, que revidavam. Quando o jogo estava 3 a 1, os nervos estavam à flor da pele. O Brasil tentava de todas as formas igualar o placar, pois tinha tempo para isso: Julinho fez o segundo gol depois de driblar toda a defesa húngara. Logo após, Nilton Santos trocou sopapos e pontapés com o meia Boszik. Os dois foram expulsos.
Em seguida, Lantós marcou o quarto gol, eliminando assim as esperanças brasileiras em vencer a partida. A Seleção Canarinho estava fora da Copa. Após o apito final, os jogadores das duas equipes protagonizaram uma verdadeira batalha campal. Teve de tudo: socos, pontapés e garrafadas. Sobrou até para Puskas, que assistia ao jogo com a delegação húngara. Para se defender de uma agressão, deu uma garrafada no zagueiro Pinheiro. Essa batalha dentro e fora de campo (inclusive no vestiário) foi batizada como a “Batalha de Berna”.
Na semifinal, a Hungria (ainda sem Puskás) enfrentou o então campeão mundial, o Uruguai, na cidade de Lausanne. A Hungria não conseguiu impor sua superioridade contra os uruguaios, como fez com os brasileiros. O jogo terminou empatado por 2 a 2, sendo decidido na prorrogação a favor do time húngaro: 4 a 2 com dois gols de Kocsis na prorrogação. E a vaga para a final, que disputaria pela segunda vez.
A consagração da seleção húngara tinha mais um capítulo. Novo encontro com os alemães. Confiantes pela sonora goleada de 8 a 3, os mágicos magiares já cantavam vitória. Mas os alemães tinham dois trunfos: A chuva e Adi Dassler, o fundador da Adidas (fornecedora de material esportivo dos alemães na Suíça). Amigo leal do técnico alemão Sepp Herberger, Dassler criou uma chuteira revolucionária na época, com travas ajustáveis – de vários tamanhos, que poderiam ser aparafusadas e desparafusadas, dependendo das condições do campo.
Sabendo que o cérebro do time alemão, o meia Fritz Walter, gostava de atuar em campos pesados, o técnico Herberger pediu ao amigo sapateiro que preparasse o equipamento para seu capitão. E assim foi feito. Em campo, com muita chuva, a Hungria se encarregou de mostrar o porquê do seu favoritismo. No início da partida, já aplicava 2 a 0 com Czibor e Puskás (jogando no sacrifício). Morlock e Rahn empataram em seguida. No segundo tempo, a Hungria, nervosa, perdia um gol atrás do outro. Enquanto os alemães, mais frios, controlavam o ímpeto de Puskás, Hidegkuti e companhia.
O desfecho da história veio aos 6 minutos finais num cruzamento mal afastado pela defesa húngara: Rahn chutou no canto de Grosics. Era a virada alemã. Feito nada imaginado por eles. Puskás ainda marcaria o gol de empate, anulado pelo árbitro por impedimento. A Hungria pressionava, mas foi impossível derrotar a determinação alemã. Os 60 mil espectadores, espremidos no Estádio Wankdorf, presenciaram a derrota de um time imbatível. Assistiam ao “Milagre de Berna”: a Alemanha Ocidental sagrava-se como nova Campeã do Mundo.
A derrota na final do Mundial da Suíça deixou milhares de húngaros incrédulos, pois a seleção perdia uma invencibilidade de 29 jogos (quatro anos) e também uma geração mágica. Por força dos confrontos do governo Comunista, liderado pelos Soviéticos, contra os revolucionários, Puskás, Czibor e Kocsis se exilaram na Espanha e não voltaram a defender a seleção magiar. Era o fim do “time de ouro”.
Na Copa de 1958, na Suécia, sem Puskás (que atuaria na seleção espanhola), a Hungria ainda contava com outros nomes do time mágico da Copa anterior, mas, sem brilho, ficou na primeira fase. Em 1966, reencontrou a seleção brasileira e venceu novamente por um placar de 3 a 1. Ficou nas quartas-de-final, eliminada pela União Soviética (perdendo a partida por 2 a 1) e terminando a competição em 6º lugar.
A Hungria voltaria a se destacar no futebol mundial nas Olimpíadas de 1964 em Tóquio e na de 1968 na Cidade do México. Com destaques para os jogadores Florián Albert, Ferenc Bene e Lajos Tichy, nova geração após o esquadrão estrelado dos anos 50, a Hungria conquistou mais duas medalhas de ouro, tornando-se a maior campeã da história dos jogos olímpicos (três títulos), marca insuperada até hoje. Em 1972, nas Olimpíadas de Munique, a seleção húngara foi à final novamente. Derrotada pela Polônia por 2 a 1, acabou levando a medalha de prata.
A partir dos anos 70, a seleção da Hungria, assim como o futebol húngaro, deixou de figurar no cenário mundial. Nos mundiais de 1978, 1982 e 1986, a seleção não passou da décima colocação, sendo sempre eliminada na primeira fase. Mesmo assim, protagonizou o maior placar da história de uma Copa do Mundo: no Mundial da Espanha em 1982, a Hungria aplicou uma goleada de 10 a 1 sobre El Salvador – superando a própria marca alcançada em 1954, quando goleou a Coréia do Sul por 9 a 0. Nesta partida de 1982, László Kiss teve destaque ao tornar-se o primeiro reserva a marcar três gols em um jogo de Copa.
Após os anos 1980, o futebol húngaro perdeu a competitividade. Tornou-se uma equipe fraca e sem brilho. Tenta sobreviver com o pouco talento dos jogadores formados no país – muito longe daquele poderoso time dos anos 50. A maioria dos atletas do selecionado atual jogam fora do futebol húngaro, em clubes de pouca expressão na França, Bélgica, Espanha, Alemanha e Inglaterra.
O único clube de destaque internacional no país é o Debreceni, que disputou na temporada passada a UEFA Champions League (Liga dos Campeões da UEFA), pela primeira vez. Mas o clube mais popular do país é o Honvéd, o qual foi destaque no mundo com o mitológico time nos anos 40, que contava com Bozsik, Puskás, Czibor e Kocsis. No último Mundial na África do Sul, os húngaros apostaram na classificação dos magiares nas eliminatórias européias.
O começo até que foi empolgante, mas no final foram perdendo forças e caindo, terminando a competição em quarto lugar e ficando de fora de mais uma Copa do Mundo – completando o sexto Mundial sem a presença da Hungria. Sem disputar competições importantes, tenta desenvolver o time em amistosos, mas nem sempre com sucesso. Retratos de um país que foi um dos gigantes do futebol mundial e que luta pra voltar aos bons tempos. Ou pelo menos tentar disputar as grandes competições da Europa e do Mundo.
Nome: Magyar Labdarúgó Szövetség (Federação Húngara de Futebol).
Fundado em: 1901
Site oficial: www.mlsz.hu
Principais títulos: Tri-campeão Olímpico (1952, 1964, 1968) e vice-campeão mundial (1938 e 1954).
Jogador com mais participações pela seleção: Josef Bozsik com 101 partidas
Maior goleador da seleção: Ferenc Puskás com 84 gols
Participações em Copas do Mundo: 9 participações (1934, 1938, 1954, 1958, 1962, 1966, 1978, 1982, 1986).
Posição no Ranking da FIFA: 62ª (até agosto 2010).
Texto publicado no Trivela dia 30 de setembro de 2010: http://trivela.uol.com.br/blog/lado-b/hungria-os-magiares-querem-voltar-a-ser-magicos/
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