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Edwards era considerado um craque nos anos 50 |
“Ele
era o jogador que fazia me sentir inferior!” Palavras de Bobby
Charlton, um dos maiores da história do futebol mundial, para
descrever Duncan Edwards, considerado uma das maiores revelações do
futebol inglês depois de Stanley Matthews – e antes de Bobby Moore
e do próprio Charlton. Talentoso, cerebral, diferenciado, um jogador
completo. Duncan Edwards atuava como meia e foi destaque nos anos 50.
É um nome admirado até hoje por torcedores de toda a Inglaterra,
principalmente os do Manchester United, time no qual atuou em sua
curta carreira. Além de brilhar na equipe comandada por Matt Busby,
ele também jogou pela seleção do país com grande excelência.
Seria um craque (segundo os ingleses, seria melhor que Pelé), se sua
carreira não fosse interrompida por uma tragédia. Por causa do
destino, ele se tornou uma lenda do futebol.
Edwards
foi um meio campista defensivo por característica, mas por muitas
vezes jogou como ala, armador, zagueiro e até como atacante – só
não jogou como goleiro. Tinha grande capacidade de defender, armar a
jogada e voltar pra defesa com velocidade jamais vista. Tinha um
notável senso de liderança para um jogador tão jovem. Jogador
dinâmico, tanto nas arrancadas como nos fundamentos, usando as duas
pernas com passes longos, curtos, cobranças de faltas e escanteios.
Outras características de destaque eram a força física e a
resistência. Dificilmente perdia numa dividida. Era como se o
adversário batesse numa rocha – tanto que foi apelidado de “Big
Dunc” e “The Tank” por causa da sua altura (1,80m) e do seu
porte físico. Bobby Charlton, seu companheiro de Manchester e de
seleção, o comparou ao Rochedo de Gibraltar. Stanley Mathews o
descreveu como “uma rocha em um mar revoltado”. Foi considerado,
por jornalistas e jogadores da Inglaterra, o jogador mais forte do
mundo na época.
Edwards
nasceu a 1º de outubro de 1936, em Dudley, uma pequena cidade
localizada, na época, no condado de Worcestershire – hoje, parte
do condado de West Midlands, próximo a Birmingham e Wolverhampton,
oeste da Inglaterra. Foi o mais velho dos dois filhos do casal
Gladstone e Anne Edwards, sendo o único a sobreviver até a
maioridade (sua irmã mais nova, Carol Anne, morreu logo após o
nascimento).
Na
escola, já chamava atenção pela sua habilidade com a bola nos pés,
tanto que foi convocado para atuar pela English Schools Football
Association, em 1950, contra o selecionado do País de Gales no
Estádio de Wembley. Edwards atuou por duas temporadas seguidas, como
meia e capitão da equipe, e já atraía atenção dos olheiros de
grandes clubes do país – especialmente o Manchester United, até
então um clube em ascensão. O jovem craque também era disputado
por Wolverhampton Wanderers e Aston Villa, clubes de cidades próximas
a Dudley (Wolverhampton e Birmingham). Mas o garoto foi seduzido pela
proposta do clube de Manchester, no norte da Inglaterra, e preferiu
atuar nos United, dizendo que era clube dos seus sonhos, gerando a
ira do gerente dos Wolves, o qual acusou o Manchester United de
oferecer incentivos financeiros para Edwards e sua família. Com o
sinal positivo de Matt Busby, que já havia ouvido falar da jovem
promessa em 1948, Duncan Edwards foi contratado pelos Red Devils em 2
de julho de 1952.
Mesmo
assim, por garantia, ele estudava carpintaria – para o caso de a
carreira no futebol não vingar.
Edwards
estreou na equipe principal do Manchester aos 16 anos e 185 dias, em
4 de abril de 1953, contra o Cardiff City, na Primeira Divisão
Inglesa. Derrota por 4x1. Mesmo com esse revés, Edwards já entraria
para a história como o atleta mais jovem a atuar profissionalmente
por uma equipe na divisão principal do futebol inglês até então.
Essa marca só foi superada em 13 de maio de 2007 por Matthew Briggs
do Fulham que, aos 16 anos e 65 dias, estreou pelos Whites na derrota
para o Middlesborough por 3x1, tornando-se o atual recordista.
Em
meio a muitos jogadores mais velhos, Edwards encarou com muita
naturalidade o desafio. Mesmo assim, Busby acabou promovendo outros
jogadores das categorias de base, como Duncan – foi de lá que
também vieram Dennis Viollet e Jackie Blanckflower. Com o ingresso
destes garotos, eles seriam conhecidos como The Busby Babies (Os
Bebês de Busby), já que todos os três tinham menos de 18 anos.
Mesmo
jogando pela equipe principal, Edwards atuava também pelo time
juvenil na disputa da FA Youth Cup (uma espécie de Copa da
Inglaterra Juvenil). O jornal The Guardian o considerava uma boa
promessa e sempre dava destaque a suas atuações, passes precisos e
arremates. Na temporada 1952/53, o jovem craque ajudou sua equipe a
faturar o título da competição.
Na
temporada seguinte, Edwards passou a atuar com regularidade no time
principal. Depois de substituir o lesionado Henry Cockburn na partida
contra o Huddersfield Town, em 31 de outubro de 1953, não saiu mais
do time. Foram 24 partidas na Liga Inglesa e uma partida na FA Cup
(Copa da Inglaterra) – partida esta na qual Manchester acabou
eliminado pelo Burnley. Mesmo com a titularidade na equipe principal,
Duncan Edwards continuava a disputar a FA Youth Cup pela equipe
juvenil, onde conquistaria mais um título.
O
bom desempenho de Edwards nas equipes juvenil e principal chamou a
atenção do técnico da seleção inglesa Walter Winterbottom. O
jogador foi convocado pela primeira vez para a seleção sub-23 e
estreou em 20 de janeiro de 1954 na Itália, contra a Azzurra.
Observado pelos olheiros da seleção principal, ele estaria a um
passo da convocação, mas no segundo amistoso contra o Arsenal, em
Wembley, sua atuação foi fraca e não foi chamado.
Na
temporada de 1954/55, marcou seu primeiro gol como profissional. Em
38 atuações no time principal do Manchester na Liga, Edwards marcou
seis gols. Com sua evolução dentro de campo, era impossível não
ser convocado pela seleção principal. Estreou aos 2 de abril de
1955 na vitória esmagadora de 7x2 contra a Escócia pelo Campeonato
Britânico. Tinha 18 anos e 183 dias, e tornava-se o mais jovem
estreante da Inglaterra no pós guerra – marca mantida até
fevereiro de 1998, quando Michael Owen fez a sua estreia num amistoso
contra o Chile (derrota inglesa por 2x0).
Três
semanas após sua primeira partida com a camisa do English Team,
Edwards foi convocado por Matt Busby para a disputa de mais uma
decisão do United na FA Youth Cup. Vitória por 7x1 sobre o West
Bromwich – e o terceiro título consecutivo. A decisão do clube em
escalar Edwards para a partida foi duramente criticada pela imprensa
porque o jogador já fazia parte da seleção principal. As críticas
chegaram a Busby e o treinador teve que se retratar nos jornais,
comentando sobre a importância do jogador nas conquistas do
Manchester.
Em
maio de 55, Edwards foi convocado novamente para a seleção em três
amistosos: contra França (derrota por 1x0 em Paris), Portugal
(derrota por 3x1 na Cidade do Porto) e Espanha (empate de 1x1 em
Madri), tendo começado as três partidas como titular. Na volta, ele
foi cumprir o serviço obrigatório no Exército Britânico. A seu
lado estava seu companheiro de clube, o também jovem Bobby Charlton.
Lá, permaneceram por dois anos, mas durante esse tempo puderam atuar
pelo Manchester normalmente.
Com
os Busby Babies em campo, liderados por Edwards, e um esquema tático
inovador, os títulos do Manchester United começaram a surgir. Nas
temporadas de 1955/56 e 1956/57, foram duas conquistas no campeonato
inglês. Mas na final da Copa da Inglaterra, na temporada 1956/57,
derrota para o Aston Villa por 2x1.
A
primeira participação do Manchester na Copa dos Campeões foi em
1956 (um ano após sua criação). Edwards participou de sete
partidas, incluindo a vitória memorável contra o Anderlecht da
Bélgica por 10x0 (considerada até hoje a maior vitória da história
do clube). O United chegou até as semifinais, sendo eliminado por
nada menos do que o Real Madrid de Di Stefano, que levaria o segundo
título do torneio. Derrota por 3x1 em Madrid e um empate no Old
Trafford.
Pela
seleção, Duncan Edwards participou de todas as quatro partidas das
Eliminatórias da Copa de 1958, com dois gols marcados sobre a
Dinamarca na vitória por 5x2 em 1956. O jovem já era considerado o
principal jogador da equipe e cotado para substituir o veterano Billy
Wright como capitão do English Team no Mundial da Suécia.
O
ano de 1958 começou com Edwards em boa forma e cobiçado por clubes
da Itália. Com 21 anos, já ganhava dinheiro também fora dos
gramados sendo garoto propaganda de uma indústria de açúcar. Bom
moço, ingênuo, sempre reservado e adepto à pesca e aos jogos de
cartas, ele nunca chamava atenção por escândalos e polêmicas. No
mesmo ano, casou-se com Molly Leach, uma jovem moça de 20 anos que
conheceu num aeroporto em Manchester.
Dentro
dos gramados, o jovem craque se destacava tanto com a camisa do
Manchester quanto com a da Inglaterra. No dia 1º de fevereiro de
1958, Edwards atuou mais uma vez pela seleção inglesa em Wembley,
marcando um gol contra o Arsenal. Mal sabia ele que a vitória por
5x4 contra os Gunners seria a última partida dele pela seleção.
Cinco dias depois, o Manchester enfrentaria o Estrela Vermelha em
Belgrado pela Copa dos Campeões (empate por 3x3 e classificação
para as semifinais), já que a primeira partida os Red Devils
venceram por 2x1 em casa.
Na
volta da Iugoslávia, o vôo BE609 da British Airways, que
transportava a equipe para casa, pousaria em Munique, na Alemanha,
para reabastecer. O tempo estava ruim demais para continuar a viagem,
pois nevava muito. A aeronave, um Airspeed Ambassador, carregava 44
passageiros, entre jogadores, comissão técnica e jornalistas.
O
piloto tenta decolar por duas vezes, mas os motores falham. Na
terceira tentativa, por volta das 15 horas, o avião levanta vôo,
porém, em seguida, um motor da aeronave pega fogo e ela cai sobre as
grades do aeroporto e em uma casa desabitada, desintegrando-se
completamente.
Dos
44 passageiros, 21 pessoas morreram instantaneamente – entre elas,
sete jogadores do Manchester, três membros da comissão técnica,
oito jornalistas e três tripulantes. Outros sete mortos eram
moradores que estavam nos arredores da queda.
Duncan
Edwards sobrevive à queda, e é levado ao hospital Rechts Der Izar
com fraturas múltiplas nas pernas e nas costelas e lesões nos rins.
Sua família fica sabendo pelos noticiários sobre a queda, mas ficam
aliviados por não verem o nome de Duncan entre os mortos.
Os
médicos estavam confiantes pela recuperação de Edwards, mas não
podiam garantir que o craque voltaria a jogar futebol. Dois dias após
o acidente, Duncan viu um rosto conhecido. Era Jimmy Murphy,
assistente de Matt Busby (o qual estava gravemente ferido e chegou a
receber a extrema unção por duas vezes, mas sobrevive). O jogador
murmurou no ouvido de Murphy que não estava no vôo porque estava à
frente da seleção galesa na repescagem para a Copa de 1958 contra
Israel no dia do acidente: “Que horas começa o jogo contra os
Wolves, Jimmy? Preciso estar pronto!” Tanto Murphy quanto os
médicos ficaram espantados com a luta de Edwards para sobreviver.
Essa força durou 15 dias. No dia 21 de fevereiro, Duncan Edwards
faleceu por insuficiência renal. Das oito vítimas fatais, a dele
foi a mais sentida. O craque se tornou uma lenda e o destino o levou.
Duncan
Edwards foi enterrado em Dudley, ao lado do túmulo da irmã Carol
Anne. Milhares de torcedores e fãs foram às ruas para o seu
funeral. Após sua morte, sua família autoriza a publicação do
livro de memórias escrito por ele mesmo e chamado “Combater Soccer
This Way” (sem tradução para o português).
Em
frangalhos, o United voltou a campo no mês seguinte comandado por
Murphy na final da Copa da Inglaterra contra o Bolton Wanderers,
derrota por 2x0. Na semifinal da Copa dos Campeões, foi eliminado
pelo Milan e no Campeonato Inglês terminou na nona colocação.
Em
Dudley, foram inúmeras as homenagens a seu filho ilustre: Duncan
Edwards virou nome de rua, condomínio e até de um bar. Um vitral
com a imagem dele foi inaugurado em 1961 na Igreja de São Francisco
com a presença de Matt Busby. Uma estátua do jogador foi posta numa
praça no centro da cidade.
O
Manchester United construiu um memorial no estádio de Old Trafford
homenageando seus 11 profissionais mortos no dia 6 de fevereiro de
1958. Uma placa com os nomes dos jogadores e membros da comissão
técnica foi posta ao lado de um relógio congelado às 15:04,
horário exato do acidente. No dia 6 de fevereiro de 2008, quando a
tragédia de Munique completou 50 anos, foram feitas muitas
homenagens aos atletas por toda Manchester e por toda a Inglaterra.
No mesmo dia, as duas equipes de Manchester (United e City) se
enfrentaram pelo Campeonato inglês. Ambas jogaram caracterizadas com
uniformes da época do acidente e fizeram um minuto de silêncio. Os
jogadores do United entraram acompanhados de crianças vestindo
camisetas com os nomes dos homenageados nas costas. Com a bola
rolando, o City roubou a cena ao vencer seu rival por 2x1.
Duncan
Edwards continua sendo lembrado até hoje como uma promessa que não
chegou a se tornar uma realidade. Com apenas seis anos de carreira,
disputou 177 partidas com a camisa do Manchester (entre juvenil e
profissional) e marcou 21 gols. Existem poucas imagens dele em ação,
mas aqueles que presenciaram o jovem craque em campo dizem que seria
o melhor jogador de todos os tempos.
Em
2002, Duncan Edwards foi incluso no Hall da Fama do futebol inglês
por seu talento dentro das quatro linhas. Bobby Charlton, companheiro
de Manchester e seleção, que sobreviveu ao acidente em Munique
disse que a morte de Duncan foi a “maior tragédia que aconteceu ao
United e ao futebol inglês”. Terry Venables, técnico da seleção
inglesa de 1994 a 1996, afirmou que, se houvesse sobrevivido ao
acidente, Edwards teria erguido a Taça do Mundo em 1966 como capitão
da Inglaterra, e não Bobby Moore. Já Tommy Docherty, ex técnico de
Manchester United, Chelsea e seleção escocesa, foi mais enfático:
disse que Edwards seria o melhor jogador de todos os tempos – à
frente de Best, Maradona e Pelé. Não só pela habilidade, mas pela
capacidade de jogar em todos os lados do campo com maestria.
Elogios
não faltam ao ex-camisa 6 do Manchester United e da seleção
inglesa. Ele poderia ser o melhor do futebol inglês e até do mundo.
Morreu jovem, mas com um talento de gente grande que não tinha
limites. Teve uma vida de promessa, por isso que se tornou
inesquecível. O mundo do futebol chorou no dia 6 de fevereiro de
1958 e até hoje se rende ao talento de Duncan Edwards – o menino
que o destino transformou em lenda, em mito.
Ficha
Técnica:
Nome
Completo: Duncan Edwards
Nascido
em: 1 de outubro de 1936 em Dudley (Inglaterra)
Falecido
em: 21 de fevereiro de 1958 em Munique (Alemanha)
Site
Oficial: www.duncan-edwards.co.uk
Posição:
Meia
Clubes:
Manchester United-ING (1952-1958)
Títulos:
FA Youth Cup (1953/54/55) e Campeão Inglês (1956 e 1957)
Seleção:
18 jogos e 5 gols marcados
Texto publicado no Trivela em 28 de janeiro de 2011: http://trivela.uol.com.br/blog/lado-b/duncan-edwards-o-destino-fez-uma-lenda/
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